Como funciona o contrato de trabalho intermitente?
A Lei 13.467/2017, já esta em vigência há três anos. Dentre as profundas modificações na legislação trabalhista trouxe a modalidade de emprego intermitente. Muitas dúvidas pairam sobre o respectivo instituto, mas independentemente, tem sido adotado por várias empresas, como uma opção de exploração de mão de obra em ocasiões específicas, previamente solicitadas.
O fato é que a questão de fundo, já chegou, inclusive no Superior Tribunal do Trabalho, que em decisão inter partes se pronunciou pela validade do contrato de trabalho intermitente. Tal decisão encoraja a contratação desse tipo de trabalho.
No entanto, para que o instrumento tenha sua validade confirmada, se submetido ao Poder Judiciário, precisa obedecer aos requisitos formais e reais, que serão tratados a seguir.
Palavras Chave: Reforma Trabalhista; Trabalho; Contrato de trabalho; Trabalho intermitente.
CONCEITUAÇÃO:
Dentre suas particularidades, oportuno destacar que contrato de trabalho intermitente é uma modalidade de emprego exceção à regra da habitualidade e subordinação contínua.
A modalidade do ofício ou profissão que se enquadrará neste tipo de trabalho dependerá das atividades desenvolvidas na empresa.
Assim, considera-se intermitente a atividade que sofre interrupções, cessando e recomeçando por intervalos, de modo intervalado ou descontínuo[1].
Esse novo tipo de contratação tem sido utilizado com frequência e
Desde já é válido destacar que, não há restrição de atividade, o que implica dizer que, qualquer função pode ser enquadrada como intermitente. O que irá definir sua natureza será a demanda, pois esta deverá ser recorrente e previsível.
REQUISITOS:
O contrato de trabalho intermitente é uma modalidade especial de contrato e por essa razão precisa ser for formalizado por escrito. Para sua validade é essencial que se observem, pelo menos, os seguintes pontos:
1. Anotação na Carteira de Trabalho. O artigo 452-A da CLT sofreu alterações para fazer constar expressamente a necessidade de anotação na Carteira de Trabalho, independentemente de previsão em norma coletiva.
2. A qualificação das partes;
3.A função desempenhada, isto é, as respectivas atividades, detalhadamente, com a elucidação do tempo necessário à sua execução, conforme enunciados n. 02 e 03 da Comissão n. 6 da 2ª Jornada de Direito material e processual do trabalho, aprovados e transformados nos enunciados n. 84 e 85:
CONTRATO DE TRABALHO INTERMITENTE: CARGA HORÁRIA
COMO O CONTRATO DE TRABALHO INTERMITENTE DEVE SER CELEBRADO POR ESCRITO, DO INSTRUMENTO CONTRATUAL DEVERÃO CONSTAR OS PERÍODOS DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS OU A ESTIMATIVA DE SERVIÇOS A EXECUTAR, A RESPEITO DOS QUAIS SE OBRIGA O EMPREGADOR.
O CONTRATO DE TRABALHO INTERMITENTE NO BRASIL NÃO CORRESPONDE AO ZERO-HOURS CONTRACT BRITÂNICO
NOS CONTRATOS DE TRABALHO INTERMITENTE, É OBRIGATÓRIO INDICAR A QUANTIDADE MÍNIMA DE HORAS DE EFETIVA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS, POIS NÃO SE ADMITE CONTRATO DE TRABALHO COM OBJETO INDETERMINADO OU SUJEITO A CONDIÇÃO PURAMENTE POTESTATIVA, CONSOANTE ARTIGOS 104, II, 166 II E 122 DO CÓDIGO CIVIL, APLICÁVEIS SUBSIDIARIAMENTE À MATÉRIA, NOS TERMOS DO ART. 8º, PARÁGRAFO ÚNICO, DA CLT.
4. As partes podem convencionar o local de prestação de serviços; os turnos de trabalho; os instrumentos de convocação e resposta (e-mail, ligação telefônica, mensagem de texto etc); e o formato de reparação recíproca na hipótese de cancelamento de serviços previamente agendados;
5. O período de tempo pelo qual o serviço será prestado, com a elucidação do tempo necessário à sua execução;
6.O valor que será pago por hora. Nesse caso, não pode ser remunerado em valor inferior ao salário mínimo vigente, inclusive do adicional noturno, caso se aplique ao caso. Também recomendasse que não seja inferior ao salário pago aos empregados que desempenham a atividade em contrato normal.
O empregado receberá imediatamente: à remuneração, férias proporcionais com 1/3, décimo terceiro salário, repouso semanal remunerado, acréscimos legais.
O recolhimento das contribuições previdenciárias e o depósito do FGTS serão pagos pelo empregador com base nos valores pagos no período mensal.
As férias deverão ser remuneradas em valor equivalente àquele devido aos demais empregados do estabelecimento que exerçam a mesma função.
Se o trabalhador for convocado em período superior a um mês, o pagamento contará a partir da data da convocação e não poderá ser estipulado em prazo superior a um mês de trabalho.
As férias poderão ser divididas em 3 (três) períodos, mediante acordo entre as partes, e são devidas após um ano de trabalho e durante o gozo não poderá ser convocado para trabalhar para o mesmo empregador.
7. O local e o prazo para o pagamento. O pagamento deverá ocorrer imediatamente após a prestação de serviços e deve contemplar a remuneração, as férias proporcionais com acréscimo de um terço, o décimo terceiro salário proporcional, o Repouso semanal remunerado (correspondente ao domingo ou dia de folga da categoria) e aos Adicionais legais como de insalubridade e periculosidade, caso sejam cabíveis.
8. Clausula especiais sobre: a requisição de trabalho e aceite e não cumprimento. A requisição de trabalho deverá anteceder a 03 dias e implicará em recusa do empregado se não houver resposta no prazo de um dia útil, hipótese que não implica em insubordinação. Em caso de aceite e não realização de trabalho será devida indenização de 50% (cinquenta por cento) da remuneração a que teria direito ou a valor deliberado pelas partes.
Aqui é oportuno destacar que o empregador pode disciplinar outra penalidade, especialmente se levado em conta que o Enunciado n. 87 da 2ª Jornada de Direito material e processual do trabalho, entende ser indevida a imposição de multa:
Enunciado 87: A MULTA PREVISTA NO ART. 452-A, § 4º, DA CLT, IMPOSTA AO TRABALHADOR QUE DESCUMPRIR CONVOCAÇÃO ANTERIORMENTE ATENDIDA, NÃO É COMPATÍVEL COM OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA DIGNIDADE HUMANA, DO VALOR SOCIAL DO TRABALHO, DA ISONOMIA, DA PROTEÇÃO DO TRABALHADOR E DA FUNÇÃO SOCIAL DA EMPRESA (Enunciado n. 05 da Comissão 6 da 2ª Jornada de Direito material e processual do trabalho)
9. O período de inatividade não é considerado como tempo à disposição do empregador, portanto não deverá ser remunerado como tal. Nesse período, o empregado poderá prestar serviços de qualquer natureza a outros tomadores de serviço, que exerçam ou não a mesma atividade econômica, utilizando contrato de trabalho intermitente ou outra modalidade de contrato de trabalho.
Diante da natureza do contrato de trabalho intermitente, notadamente, haverá o período de inatividade, isto é, o espaço de tempo no qual não haverá a prestação de serviços por parte do empregado contratado.
Como cediço, o período de inatividade não é considerado como tempo à disposição do empregador. No entanto, necessário destacar entendimento diverso no sentido de que a sazonalidade da demanda decorre do risco do empreendimento do empregador, o que acarretaria em remuneração do tempo à disposição:
Enunciado 91: NO CONTRATO DE TRABALHO INTERMITENTE, O PERÍODO SEM CONVOCAÇÃO PELO EMPREGADOR É DE TEMPO À SUA DISPOSIÇÃO E DEVE SER REMUNERADO COMO DE EFETIVO SERVIÇO. ÔNUS DAS VARIAÇÕES DE DEMANDA DO EMPREENDIMENTO SÃO EXCLUSIVOS DO EMPREGADOR. (Enunciado n. 09 da Comissão 6 da 2ª Jornada de Direito material e processual do trabalho)
No entanto, há previsão legal proibindo o pagamento do tempo de inatividade, sob pena de ser descaracterizado o contrato de trabalho intermitente.
No curso do período de inatividade é permitido ao empregado prestação de serviços de qualquer natureza a outros tomadores de serviço diversos, independentemente do tipo de atividade, seja intermitente ou não.
Assim, compete ao empregado a permanência na empresa para exclusivamente desempenhar a atividade, pois caso contrário sua permanência poderá ser considerada como tempo à disposição, devendo ser remunerado como tal:
Enunciado 89: CONTRATO DE TRABALHO INTERMITENTE. PERMANÊNCIA DO TRABALHADOR DENTRO OU FORA DO ESTABELECIMENTO DO EMPREGADOR POR CONVENIÊNCIA DESTE ÚLTIMO. CÔMPUTO COMO TEMPO DE SERVIÇO. NO CONTRATO DE TRABALHO INTERMITENTE, A TEOR DO ARTIGO 452-A, § 5º, DA CLT, OS PERÍODOS EM QUE O TRABALHADOR PERMANECER DENTRO OU FORA DO ESTABELECIMENTO DO EMPREGADOR PARA ATENDER A INTERESSES, CONVENIÊNCIAS OU NO AGUARDO DE INSTRUÇÕES DESTE ÚLTIMO SERÃO COMPUTADOS COMO HORAS OU FRAÇÕES EFETIVAMENTE TRABALHADAS. (Enunciado n. 07 da Comissão 6 da 2ª Jornada de Direito material e processual do trabalho)
10. As respectivas assinaturas e o domicilio ou sede.
Uma vez elaborado o instrumento, tem-se que, se cumpridas as disposições ali contidas,
DEMANDA PERMANENTE:
Se a demanda para qual foi contratada mão de obra intermitente for permanente, a respectiva contratação poderá ser considerada ilegal, pois não satisfará a natureza do instituto, segundo a qual exige demanda descontínuas:
Enunciado 90: É ILÍCITA A CONTRATAÇÃO SOB A FORMA DE TRABALHO INTERMITENTE PARA O ATENDIMENTO DE DEMANDA PERMANENTE, CONTÍNUA OU REGULAR DE TRABALHO, DENTRO DO VOLUME NORMAL DE ATIVIDADE DA EMPRESA. 2. É ILEGAL A SUBSTITUIÇÃO DE POSTO DE TRABALHO REGULAR OU PERMANENTE PELA CONTRATAÇÃO SOB A FORMA DE TRABALHO INTERMITENTE. 3. O EMPREGADOR NÃO PODE OPTAR PELO CONTRATO DE TRABALHO INTERMITENTE PARA, SOB ESSE REGIME JURÍDICO, ADOTAR A ESCALA MÓVEL E VARIÁVEL DA JORNADA. 4. PRESENTE A NECESSIDADE DE TRABALHO INTERMITENTE, O EMPREGADO CONTRATADO NA FORMA DO ART. 443, § 3º, DA CLT TEM DIREITO SUBJETIVO À CONVOCAÇÃO, SENDO ILÍCITA SUA PRETERIÇÃO OU A OMISSÃO DO EMPREGADOR. (Enunciado n. 08 da Comissão 6 da 2ª Jornada de Direito material e processual do trabalho).
Como dito alhures, a modalidade do ofício ou profissão que se enquadrará neste tipo de trabalho dependerá das atividades desenvolvidas na empresa.
A priori não há restrição de atividade, o que implica dizer que, qualquer função pode ser enquadrada como intermitente. O que irá definir sua natureza será a demanda, pois esta deverá ser recorrente e previsível.
Nesse caso envolvendo a rede varejista Magazine Luiza (de ampla divulgação nos meios de comunicação) o juízo de primeiro grau decidiu favoravelmente a empresa, destacando não haver qualquer irregularidade, já que a “pactuação foi feita por escrito, com a obtenção das partes, valor hora a pagar no mínimo, legal, não havendo um valor inicial igual alegação de valor ajustado inferior devido ao exercício do mesmo. com previsão do local e prazo para pagamento”.
Quando o processo chegou ao Tribunal Regional do Trabalho 3ª Região, por entender que as atividades do reclamante inserem-se na demanda permanente e contínua da Empresa, o Tribunal reformou a sentença decretando a nulidade do contrato de trabalho intermitente.
E com advento de recurso da Empresa, a Corte Trabalhista (TST) considerou válido o trabalho intermitente realizado pelos empregados da Grande varejista Magazine Luiza.
Essa decisão tem enorme relevância, por 02 motivos:
[1] Em que pese ainda existam discussões acerca da (in)constitucionalidade do trabalho intermitente no STF é o primeiro posicionamento do TST.
[2] Essa decisão, embora não tenha caráter vinculante representa excelente precedente para a validação dessa modalidade de trabalho. (Proc. 0010454-06.2018.5.03.0097).
CONSIDERAÇÕES FINAIS:
É cediço que o contrato de trabalho intermitente é vantajoso para o mercado, afinal de contas, aquele trabalhador somente será requisitado, quando houver demanda e consequentemente só será remunerado pelo tempo que trabalhar.
Considerando o conteúdo de baixo poder aquisitivo da retribuição financeira pelo trabalho prestado, o trabalhador intermitente colecionará contratos da mesma natureza, ou cumulará as funções em outras atividades informais.
O ponto de inflexão aqui reside na saúde do trabalhador.
Submetido a diferentes atividades, que exige vários tipos de esforços, somados a possível fadiga psicológica, ante a redução da capacidade econômica, as chances de adoecimento são enormes.
E nesse contexto, as empresas contratantes precisam estar cientes de possíveis riscos ergonômicos, ambientais e de outras naturezas que podem, seja por atribuição de nexo individual, nexo técnico epidemiológico ou até mesmo concausal, atribui-la a minimização da capacidade laborativa do empregado, gerando o dever de indenizá-lo, sem prejuízo as ações regressivas previdenciárias.
[1] PAIXÃO GICELLI. Comentários sobre a reforma trabalhista. São Paulo: PI, 246p.2018.
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